TRADIÇÃO IMPLACÁVEL

A tradição manteve-se, e a Itália voltou a vencer Portugal.
É de facto impressionante a dificuldade que o futebol português, de selecção e de clubes, tem sempre que defronta adversários transalpinos. Trata-se de um interessante exercício analítico perceber porque é que isso invariavelmente acontece, até para expor e entender algumas fragilidades do nosso futebol e assim procurar contrariá-las, nomeadamente a nível de formação. Grosso modo, o jogador português é espontâneo, criativo, intuitivo, mas não consegue ser rigoroso, calculista nem friamente eficaz como seria necessário diante deste tipo de adversário. Não adianta pensar que isto advém das características genéricas dos portugueses enquanto povo, pois se há povo com idiossincrasia semelhante à nossa esse é justamente o italiano.
Como seria e que força teria o futebol português que conseguisse aliar frieza e eficácia a toda a sua fantasia, aplicando em doses cirúrgicas uma e outra receita de acordo com os adversários ? Certamente imparável, e ainda mais forte candidato a títulos mundiais e europeus do que de certo modo já é.
Talvez fosse altura de reflectir sobre isso e actuar sobre os nossos jovens no sentido de os dotar daquilo que tantas derrotas nos poderia evitar, quer diante de italianos, quer de outras equipas.
Passando à selecção e ao jogo, parece-me que, além de um teste útil para perceber fragilidades, foi também ocasião para começar a desenhar a equipa. Por muito mediatismo que exista em redor de Makukula, não me parece ser, para já, e pelo seu perfil, jogador para assegurar o ataque da equipa nacional frente a equipas com a força defensiva dos campeões do mundo. Um ponta de lança mais móvel, com capacidade de recuar e abrir espaço à entrada de Deco e, sobretudo, Cristiano Ronaldo, afigura-se-me claramente mais aconselhável, podendo quer Nuno Gomes, quer Hélder Postiga desempenhar esse papel, por maior que seja a crise de forma que de momento atravessem – na verdade é o que temos… Por outro lado, resultou evidente que, na ausência de Jorge Andrade, Pepe é indispensável ao centro da defesa nacional, sobretudo pela capacidade que lhe confere a nível de jogo aéreo.
No meio campo não parece haver grandes alterações a fazer, a menos que Miguel Veloso ressurja com a força e a qualidade que evidenciou no início desta temporada, podendo nesse caso tomar o lugar de um Petit em momento de forma irreconhecível, e com menor capacidade de transição ofensiva. Resta-nos esperar também que Maniche e Deco possam aparecer em Junho bem melhor do que têm estado nos últimos meses, e a avaliar pela experiência das últimas grandes competições internacionais, temos motivos para acreditar que sim.
Ontem, em face da luta por um lugar no onze, Quaresma e Nani ganharam pontos, enquanto Bruno Alves, Caneira, Makukula, Petit e Maniche perderam-nos.
De resto não envergonha ninguém perder por 3-1 com os campeões do mundo, num jogo em que durante largos períodos Portugal até pareceu a melhor equipa no terreno – já se sabe que com italianos isso quase sempre acontece… -, embora a dificuldade de entrosamento que a nossa selecção aparenta, quando apenas faltam dois jogos de preparação antes do Europeu, deixe no ar alguma apreensão. Recordemos todavia o percurso da equipa de Scolari na antecâmara do Euro 2004, carregado de exibições e resultados decepcionantes, que não impediram a realização de uma grande campanha.E eu compraria desde já a presença em nova final, mesmo perdendo-a…
Nota positiva da jornada internacional de ontem foi que nenhum dos nossos adversários directos venceu. A Suiça perdeu em Wembley por 2-1, a Turquia empatou a zero em casa com a Suécia, e a República Checa fez ainda pior, sendo derrotada em casa por uma nossa bem conhecida Polónia por 0-2. Os checos passam por uma transição entre os tempos de Nedved, Koller (que ontem falhou um penálti), Poborsky etc, e uma nova geração vice-campeã do mundo de sub-20. Talvez seja uma boa altura para os defrontar, sabendo-se que, tal como frente a italianos, também não temos, nas últimas décadas, um historial muito feliz com eles.

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