AS CLAQUES

A assembleia-geral do Benfica correu mal. Era uma ocasião preparada à medida de Luís Filipe Vieira, e propícia para ele brilhar, ou não fosse o clube apresentar contas positivas pela primeira vez nos últimos anos. Contudo as claques estragaram a festa.
A propósito destes incidentes, importa reflectir sobre o papel das claques nos estádios de futebol, e as mais recentes imposições legais que incidem sobre elas.
Nunca fui membro de nenhuma claque, mas nem por isso deixo de apreciar a sua causa. Dão colorido aos estádios, acompanham o clube para todo o lado, apoiam-no incondicionalmente e de forma admiravelmente fiel, criam uma banda sonora sem a qual os jogos teriam seguramente menos encanto. Já assisti a muitos jogos no meio de Diabos Vermelhos e No Name Boys, e sempre achei que se fazia um “bicho de sete cabeças” das claques e dos seus membros, quando no fundo nelas cabe toda uma panóplia de jovens de diferentes meios, diferentes origens sociais, e diferentes hábitos de vida, ao fim e ao cabo, representativa daquilo que é a realidade da juventude nas malhas urbanas em redor das principais cidades do país. Aliás os estádios portugueses, com ou sem claques, são de um modo geral bastante seguros, e é muitas vezes a televisão que lança o anátema da violência, quiçá com propósitos não tão isentos quanto possam parecer. Quem os frequenta sabe que assim é.
Sou pois um adepto das claques, acho que acrescentam mais aos estádios e aos clubes do que aquilo que subtraem, são depositárias de uma fidelidade clubista que devia fazer corar de inveja alguns adeptos que só sabem assobiar, e fazem muito mais pelo espectáculo do futebol do que a generalidade de uma população que dele diz gostar, mas que apenas se limita a discutir arbitragem a partir das imagens que vê instalado no sofá. Temo até que sem elas, ao contrário do que frequentemente se ouve, os estádios estivessem ainda mais vazios e desconsolados, numa medida maior que a ausência dos seus membros.
Isto obviamente não desculpa os vários excessos a que estes grupos por vezes se dão, que se nalguns casos representam fenómenos perfeitamente naturais da juventude, noutros assumem proporções quase para-criminais. Mas também aqui é preciso saber distinguir o trigo do joio, e atender ao que tem sido a história dos últimos dez anos do movimento ultra em Portugal, verificar quem causa distúrbios, quem ameaça, quem agride, e quem desestabiliza nos locais onde vai. E também, quem faz do clube um negócio de proporções assinaláveis, com venda de material contrafeito ou agenciação de deslocações negociadas por baixo da mesa, quem o utiliza como instrumento de poder pessoal ou tribal, ou pior, o aproveita para outros negócios ainda menos lícitos e mais gravosos, dos quais chega a fazer gala nos meios de comunicação social e até mesmo em livros. Percebe-se que a esses seja necessário afastar do futebol, e entende-se que se procurem medidas para o levar a cabo. O que me parece estranho é que o governo, pela mão do inenarrável Laurentino Dias, além de se eximir de fazer essa tal triagem, tenha decidido que o combate às claques e aos seus excessos se devia fazer justamente por aquilo que elas têm de melhor: as suas bandeiras, as suas tarjas, o seu colorido. A situação tem tomado contornos verdadeiramente caricatos, com as claques organizadas, a cantarem, e a apoiarem a equipa a partir dos seus locais, mas proibidas de levantar uma bandeira sob pena de uma intervenção policial completamente desproporcionada e em tons quase (se não é parece...) vingativos - assisti a isso já esta época na Luz. A este respeito é curioso lembrar e comparar a inércia das forças da ordem, quando na época passada os Super Dragões perpetraram uma autêntica ofensiva militar contra adeptos do Benfica sentados na bancada abaixo, e daí tirar ilações sobre a qualidade das nossas forças policiais e de quem as tutela.
Preferia que nada tivesse acontecido ontem, e não me parece que ofender os dirigentes máximos do clube, num espaço nobre como é uma assembleia-geral, seja um bom princípio de legitimação de um protesto. Mas há que perceber aquilo que a maioria das claques são, e deixar de as colocar todas no saco da violência e do crime, ou seja, afirmar de forma clara que Super Dragões e Movimento Ultra não são necessária ou rigorosamente a mesma realidade. Talvez esse seja um bom ponto de partida para fazer face ao problema que se pretende resolver.
NOTA: Na sequência do comentário do leitor Quetzal Guzman, pude confirmar que tem sido de facto a direcção do Benfica a tentar impedir a utilização das tarjas, provavelmente como forma de demonstrar a intenção de cumprir a lei, e de se furtar a eventuais penalizações. Se como for, este aspecto nada altera o essencial da questão, pois tal como as bandeiras, não são formalidades burocráticas que irão impedir a violência. Curiosamente, os Super Dragões foram dos primeiros a "legalizarem-se"...
E o que se tem lido e ouvido por aí, de pessoas que, escrevendo em jornais, não têm a mais pequena noção do que é uma claque ?

6 comentários:

Anónimo disse...

LF

Eu também gosto das claques, dos seus canticos, do seu clorido e do seu apoio á equipa, gosto porque acho que o espectaculo do futebol necessita dessas claques

Agora, também acho que as claques deveriam ser organizadas de uma outra maneira, tem de haver um "travão" aos seus desvaneios e esse "travão" só se consegue com regras muito cláras

As regras terão de ser ditadas, pela direcção da Benfica SAD, se aquela atitude vem das claques, ou dos seus responsaveis, mais vale não haver claques

As claques, não podem viver numa total anarquia e fazer frente aos elementos responsaveis pelo clube ou pela Benfica SAD, poderiam fazer ver os seus pontos de vista, mas ordeiramente, não com insultos e com ameaças aos jornalistas

Na minha opinião, esta situação não ajudou em nada a situação das claques, não é á força que se consegue o que pretendemos, o resultado desta "arruaça" foi confirmar o que se pensa das claques, arruaçeiros e jovens deliquentes, que fazem o que querem, sem dar "cavaco" a ninguem

Depois há, a oportunidade destes desacatos, os jogadores estão a lutar para se ultrapassar esta fase má da equipa, estão a tentar apaziguar o povo benfiquista, a ultima coisa que se esperava, neste momento, era desta "bomba" e deste acto de terrorismo interno, logo no momento, em que se iam apresentar as contas positivas do clube

Acho que esta atitude das claque, não ajudou o Benfica em nada, esta situação vale por 1 milhão de assobios durante os jogos, agora são todos os programas desportivos a falar nisso, os telejornais a abrir com esta noticia, foi um murro no estomago, dado por aqueles que deveriam defender o Benfica

Quetzal Guzman disse...

Bom post. Mas olha que acho que a proibição das bandeiras parte dos Clubes que assim querem pressionar os adeptos. É, pelo menos, o que alguns polícias já comunicaram. E a Lei não menciona essa proibição.

Catn, a expressão terrorismo interno parece-me desproporcionada, embora compreenda a associação devido ao que se passou. Mas repara que houve a preocupação de se utilizar o sítio próprio para se tentar debater as coisas. Não houve manifestações no estádio, perante um directo televisivo, não se foi para os jornais, não houve vandalismo de qualquere spécie. Utilizou-se uma AG para se exprimir o seu descontentamento. Não se papagueou, como LFV gosta de dizer, foi-se directamente a quem de direito.

LF disse...

Eu também não concordo com o método utilizado, que passou pelo insulto e pela arruaça num espaço nobre do clube.
Discutir as questões sim, mas não daquela forma. Até por respeito a todos os outros sócios que, como eu, não pertencem a nenhuma claque e não são menos benfiquistas por isso. Se me permitem, foi um pouco "à Porto"...
Mas também me parece excessivo falar de terrorismo.
De qualquer modo o meu post não era sobre este episódio em particular, mas sim, a pretexto dele, sobre as claques e o seu papel, e a nova legislação que me parece passar ao lado do problema.

Se de facto a proibição das bandeiras parte do clube, não me parece uma forma correcta de abordar o problema. Até porque é manifesto que as claques continuam em posse dos seus sectores no estádio, e segundo me parece, das sedes nas instalações da Luz.
Assim sendo, a questão das bandeiras será para simular um não apoio que de facto ainda existe.

Quetzal Guzman disse...

LF, também não sou de nenhuma claque, mas não é por aí. A maioria dos elementos das claques presentes também não queria que aquilo virasse peixeirada e saíu de lá algo triste com a atitude assumida por alguns.
Quanto às sedes, posso-te informar que a dos NN está encerrada há pelo menos dois meses.

Anónimo disse...

LF

Aceito, que "terrorismo" foi forte, mas uma arruaça destas, numa AG do clube, tambem não me parece que seja correcto, mesmo que seja esse o lugar indicado para se debater os problemas, civilizadamente, sem gritos, sem ofensas, bastavam pedir a palavra e falar, por os seus pontos de vista e ouvir a direcção

As Claques, deveriam falar calmamente e sem "estrilhos", deveriam aproveitar a comunicação social, para fazer passar o seu problema e pedir explicações a Direcção, esta tinha de dizer algo

Agora assim, perderam todo o respeito, que tanto falam e que se deveria ter pelas Claques, tinham de demonstrar que eram pessoas de bem e não "arruaçeiros"

Penso que este problema, é devido á má organização das Claques, estas para serem ouvidas, tinham de ser representadas pelos seus lideres, não por varios elementos das 2 Claques

Acho, que a ideia do Governo, em legalizar as Claques, ou seja transforma-las em associação é responsabilizar alguem, dos seus actos, parece-me cláro, que não iam dizer, que a claque do fcp, é a unica responsavel pela violencia no desporto em Portugal e como se costuma dizer "por o mal de um, pagam todos"

Continuo a não perceber, o problema da legalização por parte das Claques do Benfica, têm medo do que ?

Não percebo, gostava que alguem das claques, viesse comentar este post e ficavamos todos a perceber melhor este problema

Velho Estilo disse...

"Não percebo, gostava que alguem das claques, viesse comentar este post e ficavamos todos a perceber melhor este problema"

Sugiro uma rápida olhada no Blog www.veultras.blogspot.com , talvez possa ajudar um pouco.

Caso não ajude, falo na primeira pessoa.

Frequento as claques do Benfica desde os 13 anos. Foi entre as bandeiras, as faixas, as mensagens, os cânticos e as viagens que passei a minha adolescência e me fiz adulto. Nunca consumi qualquer tipo de drogas e nunca lucrei com qualquer tipo de negócio paralelo e hoje com quase 30 anos continuo a acompanhar o clube do meu coração numa claque, ou Grupo Ultra, como prefiro. Tenho um bom emprego, um curso universitário e vida estável. Tenho muitos amigos na minha “curva” e estive presente na Assembleia Geral do Benfica com (ao contrário do que os comentadores televisivos tentam passar) com os meus 20 votos. Como votei ou deixo de votar só a mim me diz respeito. Respeito esse que falta na direcção do Benfica para com os Diabos e para com os NN que, num caso há 25 anos noutro à 15, acompanham em todo o lado o Benfica. Não está em causa a legalização, apesar de discordar com ela. E porquê? Porque não concordo com a exigência de ficheiros detalhados acerca dos seus membros a claques quando vemos outras situações (ex partidos políticos extremistas…) em que o mesmo não se aplica. Será justo? Será justo tudo exigir às claques e as mesmas continuarem a pagar 25€ ou mais em jogos a kms de casa num domingo à noite? A serem agredidos e descriminados (como os últimos casos da Fúria Azul a regressar do Dragão ou dos DV e NN em Setúbal) por serem membros de um movimento orientado pela paixão? Há excessos? Há.. Deve ser irradicados. Mas ao legalizar, ou a exigir essa legalização não se separa o trigo do joio. Mete-se é toda a gente no mesmo saco. Como criminosos a dar os seus dados. E para ironia… alguns “criminosos” são os primeiros a “legalizarem-se”… Portugal no seu melhor…